7 de jun. de 2009

Responsabilidade de Falar

"Minha mulher me chama de Grouxo – aquele personagem dos X-Men que tem a língua enorme; outras vezes diz que, quando eu morrer, meu corpo vai num caixão e minha língua num caminhão (imaginem o que ela tem ouvido por aqui...). Para quem gosta de escrever, isso é um elogio. No entanto, eu sei que a verborragia é uma doença e não uma virtude. A doença de Grouxo é falar sem responsabilidade. Para falar uma vez é preciso calar mil. Ou, como dizia meu avô, o falar é de prata e o calar é de ouro.

O povo espírita diz que reencarnamos para cumprir um ciclo de limpeza cármica. (centrífuga divina, não ria...). Você compreende isso? Nós nos sujamos na infância da alma e Deus (seja lá o que isso for), eternamente misericordioso, permite que voltemos à fonte para nos limparmos. Essa teoria é análoga à da Colônia Penal, pela qual estaríamos aqui para cumprir uma pena, como intuiu o faminto Kafka. Eu não estou escrevendo sob inspiração de nenhum espírito, salvo engano, por isso, meu raciocínio não é suficiente para penetrar nas sutilezas dessas teorias. Entendo apenas que na outra encarnação eu nasceria mudo.

Sim, o mal é o que sai da boca do homem. Deve-se acrescentar: porque o coração está cheio. A língua é apenas um instrumento do coração. Ela é um escravo obediente. Abusar do escravo pode aleijá-lo. Muito bem, mas a raiz do problema está mesmo no coração, a fonte conspurcada donde brota a água venenosa do rancor, o fel da revolta, e todas as outras maldades. Horror! Eu não quero voltar mudo. Não quero meu coração impuro com as ilusões do mundo. Quero limpar minhas mãos e aprender a falar com a brandura de quem conhece o mal, mas não compactua com ele, nem o dissemina.

Não disseminar a revolta, mesmo sensibilizado com os que sofrem sem lar, sem afeto, sem remédio, sem amigo; mesmo compreendendo as vergonhas do homem e as prepotências de classe; mesmo compreendendo as mentiras que se divulgam para ocultar a corrupção; mesmo compreendendo que o mundo é dos vitoriosos. Vitoriosos, dos quais Sarney nos deu uma definição perfeita ao defender Renan Calheiros no Senado: "ele não chegou até aqui porque é santo"...

Como falar, despertando a consciência (crítica, antes de tudo), sem despertar junto a serpente do mal adormecida no coração do homem? A resposta vem do Cristo, cuja psicologia profundíssima ainda nos assombra:

- Ai de vós, escribas e fariseus hipócritas, que limpais por fora o copo e o prato e que estais por dentro cheio de rapina e impurezas! Fariseus cegos! Limpai primeiro o interior do copo e do prato, a fim de que também o exterior fique limpo.

Sim. Limpemos nosso coração para que nossa boca fale palavras de luz. Limpemos o coração antes de demonstrar as sombras do mundo, sob o risco de sermos devorados por elas.

Meu esforço para compreender as palavras do Cristo talvez me salve de voltar mudo."