Este texto é muito importante para entender a história política brasileira desta década. Conseguir ler o que está escrito nas entrelinhas é fundamental para compreender o sentdo do jogo do poder.
Fonte: Revista Piaui
Faltava pouco para as nove horas da noite de uma chuvosa sexta-feira de junho quando Sérgio Rosa entrou no salão de festas do clube dos funcionários do Banco do Brasil no Rio, que fica em frente à Lagoa Rodrigo de Freitas. Carregava uma caixa de uísque Red Label, vestia camisa cor-de-rosa e calça cáqui e tinha ao lado o filho Mateus, de 12 anos, que usava uma roupa exatamente igual. Compenetrado, inspecionou as mesas cobertas com toalhas verde-claras, sobre as quais havia velas, flores e guardanapos brancos. Perguntou ao dj se estava tudo certo com a aparelhagem de som e cumprimentou os garçons. Sérgio Rosa acompanhou passo a passo a organização da festa do seu aniversário de 50 anos. O convite foi ele mesmo quem bolou: um jornalzinho intitulado Tribuna do Sérgio Rosa - fundado em 23 de junho de 1959 (data do seu nascimento). Logo abaixo, uma foto dele menino e outra, atual, de óculos, cabelos negros sem um fio branco, e um raro sorriso. Junto delas, a afirmação: "Pronto. Cheguei até aqui. Meio século de vida. O que posso falar desse tempo e de mim?" O garoto de calças curtas tornou-se presidente do maior fundo de pensão da América Latina, Previ, a caixa de previdência dos funcionários do Banco do Brasil, que tem um patrimônio de 121 bilhões de reais. Comanda a entidade desde que o Partido dos Trabalhadores subiu ao poder. A Previ é sócia de algumas das maiores empresas do Brasil, entre elas a Vale do Rio Doce, de mineração, a Oi/Telemar, de telefonia, a Brasil Foods, de alimentos, e a Empresa Brasileira de Aeronáutica, fabricante de aviões. No jornalzinho-convite, Sérgio Rosa aludiu a um verso de Fernando Pessoa para dizer que espera um futuro "que valha a pena, e que a alma não seja pequena. Com minha mulher, meus filhos, amigos, companheiros e parceiros". Nenhum dos grandes empresários que são parceiros da Previ foi à festa. Os amigos e companheiros compareceram em peso.
Pouco antes das 10 horas, entrou no salão o presidente do pt, Ricardo Berzoini, acompanhando a mulher de Sérgio Rosa, Gema, uma morena magra e sorridente, trajando um vestido preto com um cinto prateado. Chegou em seguida Luiz Gushiken, o ex-ministro de Comunicação de Lula. O círculo íntimo do aniversariante se fechou com a entrada de Wagner Pinheiro, o presidente da Petros - o fundo de pensão da Petrobras -, de Guilherme Lacerda, dirigente da Funcef - o fundo da Caixa Econômica Federal -, e do gerente executivo de Comunicação Institucional da Petrobras, Wilson Santarosa, que é também presidente do Conselho Deliberativo da Petros.
Na última campanha de Ricardo Berzoini para deputado, Sérgio Rosa, Wagner Pinheiro e Guilherme Lacerda doaram, cada um, 10 mil reais para o amigo. À exceção de Lacerda, o grupo é egresso do sindicalismo bancário paulista, liderado nos anos 70 e 80 por Gushiken. Eles fizeram oposição aos pelegos ligados à ditadura e ao Partido Comunista Brasileiro, foram eleitos para a diretoria do sindicato e participaram da formação do pt e da Central Única dos Trabalhadores, a cut. Por fim, migraram para os fundos de pensão de companhias estatais, nos quais combateram as privatizações promovidas pelos tucanos durante o governo de Fernando Henrique Cardoso. Com Lula no poder, chegaram à presidência dos fundos, passaram a defender as privatizações e a gerir centenas de bilhões de reais.
Sérgio Rosa nasceu em São Paulo, numa família de classe média no bairro da Penha. Seu pai veio de Portugal com 17 anos para trabalhar com um dos catorze irmãos, dono de um açougue na cidade. Continuou no ramo e montou seu próprio negócio, o Açougue Gouvêa. Aos 13 anos, Sérgio Rosa foi convocado pelo pai para aprender o ofício. Todos os dias, depois das aulas na escola pública, o menino rumava para o açougue. Sua função era desossar as carnes, coisa que odiava. A parte mais terrível era limpar peças de contrafilé, cheias de ossinhos. "Eu não tinha a menor habilidade, ficava lá manobrando a faquinha, mas era um desastre", contou Sérgio Rosa durante um almoço num restaurante carioca, onde comeu peixe grelhado com espinafre. "O pior de tudo era ficar com a carne entranhada debaixo das unhas."
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